NEOgastrossexual deveria ter sido o meu nome, tal a primazia que dou à descoberta - do novo ou do desconhecido - neste mundo de sentidos (in)satisfeitos pelos alimentos.
É portanto para mim inevitável a aceitação de um convite para uma descoberta (mesmo que o convite seja um desafio, mesmo que a descoberta seja uma refeição num restaurante), principalmente se a tiracolo vêm frases-tentação como "novas promessas" ou "potencial elevado".
Percorri assim recentemente mais um pouco deste percurso - que tende inevitavelmente para infinito - de descobrir tudo de todas as maneiras, pela mão dos dois jovens - provocadores? desafiadores? inovadores? - que constituem o colectivo Confidential Kitchen, Mr. Miyagi, Mr. Magoo. Referências cinéfilas, televisivas e as palavras do site,
"Conjugamos a paixão que temos nos alimentos da terra e do mar, com os conhecimentos ancestrais e tecnológicos que intensamente buscamos para os poder transmitir.
É uma cozinha nada fundamentalista, que alia tradição à inovação, conhecimento e técnica, mas cujo principal objetivo consiste em manter e realçar o sabor natural dos preciosos produtos que a natureza nos dá, natureza essa que é a nossa grande inspiração."
a prometerem uma boa experiência, humor, cumplicidade, identificação.
Mesa animada pela expectativa da descoberta, mesa a pedir para ser encantada, mesa provocada pelas cores e cheiros vindos da cozinha próxima.
[Ao cristalizar a experiência em palavras, relembro as palavras trocadas mais tarde: "Tendências portuguesas sem fundamentalismos. O principal tem de ser boa comida. Nós queremos que se viva uma experiência. O objectivo é que a pessoa em cada prato tenha boas sensações. Que se aperceba que cada coisa foi pensada de propósito, está ali por uma razão."]
E a experiência começa embalada pelo Blanc de Blancs da Filipa Pato,
e anunciada, prato a prato, pelos autores (ok, os títulos foram anunciados, os itálicos surgiram na conversa posterior).
"O bacalhau... As pessoas ao princípio pensarem que bacalhau e mel não é uma boa ligação e depois verificarem que, afinal... As pequenas ervas juntas não o são só pelo visual, são-no pelo sabor, muito suave o poejo, o alho silvestre que liga sempre muito bem com o bacalhau e depois o aroma floral do mel."
Um "aperitivo" a enunciar alguns dos princípios que norteiam a equipa: pratos que são memória colectiva como ponto de partida, a identificação de alguns elementos chave e o risco de procurar casamentos mais inusitados, à partida menos expectáveis, usando técnicas mais contemporâneas. As línguas de cremosidade certa e a emulsão com um sabor bem pronunciado de azeite sem ser intrusivo, pesado, enjoativo. O véu, uma lâmina gelatinosa, muito suave, sabor enleante que não perturba a fruição das línguas. Muito bom.
"Tentei fazer uma apresentação muito visual em que o sabor fosse muito característico. Dei-lhe um lado muito apurado, as favas sem casca, não demasiado cozidas para não amargarem (foram bringidas só um minuto e meio). O tomate é feito com uma técnica que aprendi no Mugaritz, retirada da tradição de alguns países da América do Sul (e que consiste em mergulhar o tomate numa calda de água e cal) e que aqui utilizámos não tanto pela concentração do sabor mas pela aparência."
Entrada compenetrada das favas, "trincantes" ("tremoçantes"!), de bom sabor, finas fatias estaladiças (chips) de enchidos (chouriços de carne e de sangue), muito bem conseguida apresentação. Infelizmente, a estufa do tomate a deitar por terra o equilíbrio, aposta de elevado risco para um produto que não está de estação, impossibilitado de apresentar um mínimo de sabor. Talvez no pico da estação, a variedade certa, plena de sabores, consiga aguentar o desafio que é a sua cozedura. A ideia do recheio com espuma de fava pode ser melhor explorada. Prato que merece evolução para aproveitamento da ideia base.
"Pensei no camarão ao alhinho... Foi uma desconstrução, dos coentros, a procura de um efeito visual..."
Para mim a estrela da noite. Simples, de sabores certos, combinação perfeita, o puré com o sabor intrometido do alho, os rebentos de coentros e, principalmente, os dois molhos, o vermelho - essência da essência da cabeça dos camarões -, o verde - azeite de salsa -, um prato tuga nova geração, cinco estrelas.
"Tem uma apresentação muito bonita, mas não vale só por isso, vale pelo sabor que tem, um esparregado muito cremoso com o sabor a alecrim, a cherovia que é super-aromática (mergulhada previamente na calda de cal, cozida em água e sal e depois corada), o borrego, cozinhado a baixa temperatura e depois corado e que fica com uma textura fantástica e o molho de carne e cogumelos"
Muito bom também, a cherovia é uma estrela por direito próprio, tanto visual como gustativamente, muito bem trabalhada tanto na superlativação do gosto como na manutenção da forma. O esparregado de alecrim mereceria ser vedeta em prato próprio tal a excelência da textura como o prazer que o sabor proporciona. Casamento acertado e a peça de carne cozida a baixa temperatura, bem apresentada e confeccionada.
"O sonho surgiu em gelado para não ser demasiado pesado. As ervas são muito importantes, ligam muito bem com o queijo, Fazem-me lembrar um queijo mais aromatizado, não tão artificial, mais intenso e complexo. Canela a lembrar o sonho..."
Queijo de cabra, sonho de abóbora, merengue de canela, oxalis e hortelã da ribeira. O prato que menos arrisca na escolha dos ingredientes e do casamento. Bem confeccionado, mostrou agradar aos adeptos da doçaria. (Não sendo um convertido muito convicto, para me arrancar aplausos as sobremesas têm de ser estratosféricas...) Gostei do azedo da oxalis a perturbar o locus amoenus do prato...
Referência para os vinhos servidos, bem escolhidos e boas companhias, com uma palavra especial para o Teoria que não conhecia e que me merece os maiores encómios.
Aprovação total para esta quase neófita parceria, gente compenetrada e que merece apoio no desenvolvimento do sonho que acalenta. Gente que revela espírito curioso e abertura ao mundo, mais na aprendizagem de métodos e abordagens do que na cópia das soluções. Gente deste tempo que pergunta convicta, em vez de porquê, porque não?
Misters, estou do vosso lado.
Confidential Kitchen
Contactos e mais informações: http://confidentialkitchen.com.pt
(A propósito dos alimentos. Por causa dos alimentos. Em redor dos alimentos.)
É portanto para mim inevitável a aceitação de um convite para uma descoberta (mesmo que o convite seja um desafio, mesmo que a descoberta seja uma refeição num restaurante), principalmente se a tiracolo vêm frases-tentação como "novas promessas" ou "potencial elevado".
Percorri assim recentemente mais um pouco deste percurso - que tende inevitavelmente para infinito - de descobrir tudo de todas as maneiras, pela mão dos dois jovens - provocadores? desafiadores? inovadores? - que constituem o colectivo Confidential Kitchen, Mr. Miyagi, Mr. Magoo. Referências cinéfilas, televisivas e as palavras do site,
"Conjugamos a paixão que temos nos alimentos da terra e do mar, com os conhecimentos ancestrais e tecnológicos que intensamente buscamos para os poder transmitir.
É uma cozinha nada fundamentalista, que alia tradição à inovação, conhecimento e técnica, mas cujo principal objetivo consiste em manter e realçar o sabor natural dos preciosos produtos que a natureza nos dá, natureza essa que é a nossa grande inspiração."
a prometerem uma boa experiência, humor, cumplicidade, identificação.
Mesa animada pela expectativa da descoberta, mesa a pedir para ser encantada, mesa provocada pelas cores e cheiros vindos da cozinha próxima.
E a experiência começa embalada pelo Blanc de Blancs da Filipa Pato,
e anunciada, prato a prato, pelos autores (ok, os títulos foram anunciados, os itálicos surgiram na conversa posterior).
Línguas de Bacalhau com Véu de mel |
Um "aperitivo" a enunciar alguns dos princípios que norteiam a equipa: pratos que são memória colectiva como ponto de partida, a identificação de alguns elementos chave e o risco de procurar casamentos mais inusitados, à partida menos expectáveis, usando técnicas mais contemporâneas. As línguas de cremosidade certa e a emulsão com um sabor bem pronunciado de azeite sem ser intrusivo, pesado, enjoativo. O véu, uma lâmina gelatinosa, muito suave, sabor enleante que não perturba a fruição das línguas. Muito bom.
Favas com Tomate recheado |
Entrada compenetrada das favas, "trincantes" ("tremoçantes"!), de bom sabor, finas fatias estaladiças (chips) de enchidos (chouriços de carne e de sangue), muito bem conseguida apresentação. Infelizmente, a estufa do tomate a deitar por terra o equilíbrio, aposta de elevado risco para um produto que não está de estação, impossibilitado de apresentar um mínimo de sabor. Talvez no pico da estação, a variedade certa, plena de sabores, consiga aguentar o desafio que é a sua cozedura. A ideia do recheio com espuma de fava pode ser melhor explorada. Prato que merece evolução para aproveitamento da ideia base.
Camarão ao Alhinho |
Para mim a estrela da noite. Simples, de sabores certos, combinação perfeita, o puré com o sabor intrometido do alho, os rebentos de coentros e, principalmente, os dois molhos, o vermelho - essência da essência da cabeça dos camarões -, o verde - azeite de salsa -, um prato tuga nova geração, cinco estrelas.
Pá de borrego, esparregado, cherovia e pleurotes (infelizmente sem foto do prato; fica a memória do borrego...) |
Muito bom também, a cherovia é uma estrela por direito próprio, tanto visual como gustativamente, muito bem trabalhada tanto na superlativação do gosto como na manutenção da forma. O esparregado de alecrim mereceria ser vedeta em prato próprio tal a excelência da textura como o prazer que o sabor proporciona. Casamento acertado e a peça de carne cozida a baixa temperatura, bem apresentada e confeccionada.
Sonho de abóbora com creme brulée de queijo de cabra |
Queijo de cabra, sonho de abóbora, merengue de canela, oxalis e hortelã da ribeira. O prato que menos arrisca na escolha dos ingredientes e do casamento. Bem confeccionado, mostrou agradar aos adeptos da doçaria. (Não sendo um convertido muito convicto, para me arrancar aplausos as sobremesas têm de ser estratosféricas...) Gostei do azedo da oxalis a perturbar o locus amoenus do prato...
Referência para os vinhos servidos, bem escolhidos e boas companhias, com uma palavra especial para o Teoria que não conhecia e que me merece os maiores encómios.
Aprovação total para esta quase neófita parceria, gente compenetrada e que merece apoio no desenvolvimento do sonho que acalenta. Gente que revela espírito curioso e abertura ao mundo, mais na aprendizagem de métodos e abordagens do que na cópia das soluções. Gente deste tempo que pergunta convicta, em vez de porquê, porque não?
Misters, estou do vosso lado.
Confidential Kitchen
Contactos e mais informações: http://confidentialkitchen.com.pt
Olá Pedro,
ResponderEliminarObrigado pela critica.
Abraço
De nada, Mr. Miyagi! Keep up the good work U2!
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