Querida Mô,
Muitas vezes existe um mundo a separar um nome da sua realidade. Ontem escrevia-lhe sobre a sensação de liberdade que senti quando descia a avenida a caminho de um Rossio em festa cívica. Não me lembrei de comentar a suprema ironia (em que o anterior regime era pródigo, quase sempre involuntariamente) que era a principal avenida da capital de um país em controlo permanente ser crismada com aquilo que este parcimoniosamente distribuía.
Uma Liberdade onde não existia a permissão para mais de 3 pessoas se encontrarem na rua (uma conspiração!) ou para namorar (uma ofensa aos bons costumes!).
Uma Liberdade que varria para as traseiras o único espaço disponível de liberdade - o Parque Mayer - liberdade de costumes e liberdade de pensamento, cuidadosamente vigiadas. Dessa terra que a acolheu, onde o calor foi sempre um obstáculo à rigidez de pensamento, será talvez difícil imaginar a carga negativa que, por aqui, integrar o mundo do teatro - o de Revista, ainda por cima! - continha. E, no entanto, paradoxalmente, quanta fama atingiam as grandes vedetas desse tempo, com o talento impulsionado pela cumplicidade com que entregavam aos espectadores as cifradas mensagens de crítica. Ao português malandrinho que sempre preferiu a encapotada resistência a uma oposição frontal, este piscar de olho caía como mosca no mel. Um português subjugado pela bota férrea da ditadura, de acordo com a propaganda posterior, um povo achatado pelo peso enorme do seu próprio atraso, espelhado na mesquinhez do dia-a-dia.
Achatado como as pataniscas, essa maravilha de concisão e de poupança que acompanharam tanta cerveja bebida entre o desconsolo da realidade e a ilusão dos palcos.
Muitas vezes existe um mundo a separar um nome da sua realidade. Ontem escrevia-lhe sobre a sensação de liberdade que senti quando descia a avenida a caminho de um Rossio em festa cívica. Não me lembrei de comentar a suprema ironia (em que o anterior regime era pródigo, quase sempre involuntariamente) que era a principal avenida da capital de um país em controlo permanente ser crismada com aquilo que este parcimoniosamente distribuía.
Uma Liberdade onde não existia a permissão para mais de 3 pessoas se encontrarem na rua (uma conspiração!) ou para namorar (uma ofensa aos bons costumes!).
Uma Liberdade que varria para as traseiras o único espaço disponível de liberdade - o Parque Mayer - liberdade de costumes e liberdade de pensamento, cuidadosamente vigiadas. Dessa terra que a acolheu, onde o calor foi sempre um obstáculo à rigidez de pensamento, será talvez difícil imaginar a carga negativa que, por aqui, integrar o mundo do teatro - o de Revista, ainda por cima! - continha. E, no entanto, paradoxalmente, quanta fama atingiam as grandes vedetas desse tempo, com o talento impulsionado pela cumplicidade com que entregavam aos espectadores as cifradas mensagens de crítica. Ao português malandrinho que sempre preferiu a encapotada resistência a uma oposição frontal, este piscar de olho caía como mosca no mel. Um português subjugado pela bota férrea da ditadura, de acordo com a propaganda posterior, um povo achatado pelo peso enorme do seu próprio atraso, espelhado na mesquinhez do dia-a-dia.
Achatado como as pataniscas, essa maravilha de concisão e de poupança que acompanharam tanta cerveja bebida entre o desconsolo da realidade e a ilusão dos palcos.
PATANISCAS DE BACALHAU
0.5 kg de bacalhau; 250 gr farinha; 1 ramo salsa; 2 ovos; 2 dl leite; sal
Coze-se o bacalhau, limpa-se de peles e espinhas e separa-se em lascas.
O polme: Desfaz-se a farinha no leite, mexe-se de modo a evitar os grumos, tempera-se com sal, junta-se a salsa picada, os ovos batidos e as lascas de bacalhau.
A fritura: Deitam-se às colheradas em óleo bem quente. Quando fritas, colocam-se em papel absorvente.
ACOMPANHAMENTO: Salada de feijão-frade. Arroz de pimentos maladrinho.
Pataniscas da minha terra, aqui com o paradigma farinha/bacalhau algo invertido, a transformar este rico petisco de todos os dias e prato de fim de mês, em petisco rico, com leite e tudo!
ResponderEliminarEstas, que pela foto foram executadas no preceito da madragoa, são bem o exemplo do prato popular que teima em escapar a ditaduras de "chefs" e continua, airosamente, a ser coisa de povo.
A minha avó paterna, lisboeta pelo casamento fazia umas pataniscas fantásticas que quase não levavam bacalhau. Lascas de bacalhau nas pataniscas só quando as comia fora de casa pois as da minha infância recordo-as quase como uma tempura de nada, por vezes umas farripas de bacalhau e sempre com o sabor das peles e das espinhas do dito. As melhores de sempre e por certo as mais económicas
ResponderEliminarHum. Confesso, as minhas pataniscas foram aprendidas a fazer em casa de snobs. Valha a vossa atenção para as fazer descer à Lisboa popular e ribeirinha :-)
ResponderEliminar