Qual Guilherme de Baskerville perco-me nos meandros desta biblioteca virtual. Subo e desço caminhos, percorro empoeiradas prateleiras, descubro uma obra, folheio uma surpresa. Muitas vezes - as mais das vezes - esqueço-me do propósito inicial, dos passos a dar, da porta de entrada. Dou comigo absorto, abstracto, a reflectir sobre uma frase, uma nova informação, todo um mundo que, até então, se desenvolvia sem eu o conhecer.
Por exemplo: procurando descobrir um misterioso "Um Tratado da Cozinha Portuguesa do século XV" que acabou por ser o título dado pela edição brasileira, a partir do original, do "Livro de Cozinha da Infanta D. Maria", descubro Le Vivendier ("aquele que procura o alimento"), composto entre 1420 e 1440 na Flandres. Manuscrito encontrado em Kassel, num codex que continha textos do médico Jacques Despars, físico de Filipe o Bom, duque da Borgonha e do rei Charles VII. Filipe o Bom que tive forte relação com a corte portuguesa, dado o seu matrimónio com a Infanta Isabel de Portugal.
Poder-se-ão encontrar relações entre as cozinhas dos dois territórios, a partir da análise dos dois manuscritos?
Dizem os eruditos que, apesar da posse do manuscrito ser atribuída a D. Maria por, pertencendo ao espólio da família Farnèse, estar escrito em português (a infanta foi esposa de Alessandro Farnèse, terceiro Duque de Parma e Piacenze) e desta ter vivido entre 1538 e 1577, as receitas lhe serão anteriores, tendo sido escritas nos finais do século precedente. Muitos anos de diferença entre um e outro livro, ainda que as inúmeras pontes que se estabeleceram ao longo do século XV entre Flandres e Portugal (e a Flandres fazia parte do ducado da Borgonha) permitam admitir a possibilidade de "contágio" de alguns modos culinários.
Falo de cor.
E no entanto... Leia-se esta receita:
Pour faire un chaudel sur oulz pochiés. Prenez persin hachié menu et refait en bonne eaue et vergus ; faictez boulir ensamble. Mettez vos soupes en plas et oes et vostre brouet par dessus. ]154v[
(Para fazer um caldo sobre ovos escalfados. Pique salsa e ferva em água com suco de uva. Coloque as fatias de pão em pratos com os ovos e cubra com o caldo.)
Por exemplo: procurando descobrir um misterioso "Um Tratado da Cozinha Portuguesa do século XV" que acabou por ser o título dado pela edição brasileira, a partir do original, do "Livro de Cozinha da Infanta D. Maria", descubro Le Vivendier ("aquele que procura o alimento"), composto entre 1420 e 1440 na Flandres. Manuscrito encontrado em Kassel, num codex que continha textos do médico Jacques Despars, físico de Filipe o Bom, duque da Borgonha e do rei Charles VII. Filipe o Bom que tive forte relação com a corte portuguesa, dado o seu matrimónio com a Infanta Isabel de Portugal.
Poder-se-ão encontrar relações entre as cozinhas dos dois territórios, a partir da análise dos dois manuscritos?
Dizem os eruditos que, apesar da posse do manuscrito ser atribuída a D. Maria por, pertencendo ao espólio da família Farnèse, estar escrito em português (a infanta foi esposa de Alessandro Farnèse, terceiro Duque de Parma e Piacenze) e desta ter vivido entre 1538 e 1577, as receitas lhe serão anteriores, tendo sido escritas nos finais do século precedente. Muitos anos de diferença entre um e outro livro, ainda que as inúmeras pontes que se estabeleceram ao longo do século XV entre Flandres e Portugal (e a Flandres fazia parte do ducado da Borgonha) permitam admitir a possibilidade de "contágio" de alguns modos culinários.
Falo de cor.
E no entanto... Leia-se esta receita:
Pour faire un chaudel sur oulz pochiés. Prenez persin hachié menu et refait en bonne eaue et vergus ; faictez boulir ensamble. Mettez vos soupes en plas et oes et vostre brouet par dessus. ]154v[
(Para fazer um caldo sobre ovos escalfados. Pique salsa e ferva em água com suco de uva. Coloque as fatias de pão em pratos com os ovos e cubra com o caldo.)
Hum... Açorda alentejana, não?...
Se eles conhecessem os coentros... ;)
ResponderEliminarPois. :) Mas lá ficaria a açorde francesa...!
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