Deparei-me com este termo num site de um restaurante bem simpático, irmão pequeno da mais estrelada casa de Rouen: em letras bem gordas, no menu lá estava: "a carta integra obrigatoriamente um plat canaille".
Não seria preciso tanto para me espicaçar a curiosidade.
Após pesquisa exaustiva de alguns minutos (sabem quantos anos-luz percorre um electrão em "alguns minutos"?), descobri o seguinte:
Gastronómico com toda a certeza - pratos seculares, populares e de feitura simples, é o que mais haverá, ainda para mais num país deste sempre fustigado por fomes e carestia. A cozinha popular alentejana, só ela, daria um compêndio de cozinha de aproveitamento dos recursos autóctones e espontâneos (as ervas) ou muito baratos (o peixe seco, o pão). A Lisboa popular, a Lisboa dos lisboetas imigrantes, da arraia miúda, dos operários e demais carne para canhão, também tem a sua quota parte: por exemplo, os miúdos, a açorda (diversa das migas alentejanas), os jaquinzinhos, a meia desfeita, a fava rica, mesmo as caldeiradas originais, feitas dos rejeitados peixes, sobrados nas canastas das varinas.
Vocabular? Aí tive algumas dúvidas. Tradução de tradição não haverá. "Popular"? Muito teórica e sem o espírito requerido. "Vernácula"? Muito erudita. Penso que os cariocas ficariam confortáveis com "Malandra", própria da personagem típica do Rio de Janeiro mais castiço, mais genuíno. Por proximidade, pensei então num mesmo tipo lisboeta que encarnasse essa "canalhice" de bom malandro, esse gingar de esquemas e manhas. Veio-me à ideia uma cozinha com o sotaque do Jorge Jesus, o parlapié do Kilas...
Porque não cozinha pintas?
Não seria preciso tanto para me espicaçar a curiosidade.
Após pesquisa exaustiva de alguns minutos (sabem quantos anos-luz percorre um electrão em "alguns minutos"?), descobri o seguinte:
- "Plat canaille" é uma designação nova (terá menos de 50 anos) para pratos velhos, isto é, pratos tradicionais, populares, de baixo custo, de execução simples, típicos dos bistrots franceses (é um pleonasmo pretender a existência de bistrots não franceses?).
- Algumas "canalhadas" mais famosas serão as Béatilles ou amourettes, um salpicão recheado de miudezas; a Brandade, feita com bacalhau salgado ou outro peixe "barato" seco; o Haricot de mouton, feijoada "com todos" isto é, com o que estiver à mão, (eruditamente, o termo haricor, virá do latim aliquod, que queria dizer isso mesmo; não menos eruditamente, derivaria, afinal de haligot, pedaço, sendo assim um modo de cozinhar o carneiro cortado em pedaços); a Viande Marengo, ditada pela fome das tropas de Napoleão (ainda o homem era apenas um general de menos de 30 anos em ascensão na turbulenta e neófita república) na campanha de Itália, após a batalha de Marengo: Dunan, o cozinheiro do general, terá criado este prato à base de carne, tomate, cebolas, alho, azeite e vinho branco, recorrendo aos produtos disponíveis nas quintas próximas; o Salpicon, confeccionado com os restos das carnes cozidas para outros pratos e acomodado num molho feito de fines herbes, sal, vinagre e especiarias várias, degustado frio como uma salada ou quente; as Soupes au pain, talvez a mais genial das composições porque elementar e tremendamente reconfortante - europeiamente universal, da portuguesa açorda ao älle bröd finlandês, num percurso que passa pelo gaspacho, a panatta vateline, a zuppa del tavernaio florentina, ou a soupe à l’oignon gratinée (pensando bem, uma quase exclusividade sul-europeia, como raio entram os finlandeses na história?).
Gastronómico com toda a certeza - pratos seculares, populares e de feitura simples, é o que mais haverá, ainda para mais num país deste sempre fustigado por fomes e carestia. A cozinha popular alentejana, só ela, daria um compêndio de cozinha de aproveitamento dos recursos autóctones e espontâneos (as ervas) ou muito baratos (o peixe seco, o pão). A Lisboa popular, a Lisboa dos lisboetas imigrantes, da arraia miúda, dos operários e demais carne para canhão, também tem a sua quota parte: por exemplo, os miúdos, a açorda (diversa das migas alentejanas), os jaquinzinhos, a meia desfeita, a fava rica, mesmo as caldeiradas originais, feitas dos rejeitados peixes, sobrados nas canastas das varinas.
Vocabular? Aí tive algumas dúvidas. Tradução de tradição não haverá. "Popular"? Muito teórica e sem o espírito requerido. "Vernácula"? Muito erudita. Penso que os cariocas ficariam confortáveis com "Malandra", própria da personagem típica do Rio de Janeiro mais castiço, mais genuíno. Por proximidade, pensei então num mesmo tipo lisboeta que encarnasse essa "canalhice" de bom malandro, esse gingar de esquemas e manhas. Veio-me à ideia uma cozinha com o sotaque do Jorge Jesus, o parlapié do Kilas...
Porque não cozinha pintas?
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