sábado, 27 de novembro de 2010

Culinária de Lisboa #12 - Ovos Fritos com Chouriço

Querida Mô,

Não sendo nós um povo que recorre à violência para resolver os seus problemas é, no entanto, recorrente na História de Lisboa, o levantamento de rancho da arraia-miúda contra um específico alvo: o "vendido".

Precisamos de marinar o humor primeiro. Uns anos de crise moral e financeira, temperada por um decréscimo no optimismo contrabalançado pela subida da depressão colectiva e finalmente coroada por uns oportunos e bem realizados incentivos populistas e eis que a massa ululante se ergue de punho ameaçador contra o Mal personificado no pérfido que se vendeu. No auge da indignação  lá chega o herói que - badabum! - à espada, à pistola ou à janela, nos livra do dito …. e pronto, morto o bicho, acabada a peçonha, um amanhã radioso nos espera.

No dia-a-dia, também marinamos os nossos ódiozinhos de estimação. Não sei se detestamos os que declaradamente se vendem ao outro, pelo acto em si ou pela identidade do comprador. ("Vender” é, aliás, um termo inexacto – melhor seria dizer "alugar", o talento, a habilidade, a força braçal, a  disponibilidade, o corpo.) "Vender-se" é, no entanto, por ir contra a norma, um gesto de liberdade que deveria merecer a nossa admiração - paradoxalmente, talvez seja essa percepção que, ao questionar  as nossas limitações, tanta ira provoca.

Lisboa manteve desde sempre os seus recantos de desobediência moral, locais regulados ou ilegais conforme os tempos, mas sempre tolerados, talvez porque a sua frequência fosse transversal à sociedade. Na cidade marialva e fadista que foi durante séculos eram lugares mitificados, palco de pinturas e canções, de vozes e lendas. Depois, com a revolução sexual,  tornaram-se simplesmente decadentes. Mouraria, Bairro Alto, Cais do Sodré, Intendente, Parque Eduardo VII, uma cronologia que mapeia tanto o crescimento da cidade como a caída em desgraça de alguns dos seus bairros.


Uma ceia de meninas de virtude fácil, com guitarrista e luz de velas é ou não é, diga-me lá, um bom contraponto lusitano às magníficas histórias baianas do mestre Amado?


OVOS FRITOS COM CHOURIÇO

Por cada ovo: 2 rodelas de chouriço; pimenta; azeite

Aqueça o azeite, coloque o chouriço e deixe fritar um pouco. Acrescente os ovos com o azeite bem quente para a clara fritar depressa sem cozer a gema. Retirar assim que as bordas começarem a acastanhar.

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