De cada vez que descubro estes textos aumenta mais um bocadinho a minha convicção que Portugal não precisa nem de ideias nem de propostas nem de direcções.
Precisa é de acção. Está (quase) tudo dito e (quase) nada feito.
"Condicionantes e Potenciais dos Produtos Tradicionais" da Região do Algarve, é um estudo muito interessante elaborado por António Oliveira das Neves e editado pela Comissão de Coordenação da Região do Algarve. Analisa com profundidade todos os produtos que a região está em vias de deixar de produzir (ou seja, quase todos), aponta razões, indica caminhos de reabilitação. Aparentemente, os 500 exemplares que a edição mereceu em 2003 eram mesmo indicadores do pouco interesse que iria despertar - já que, pelo panorama actual, "tudo como dantes, quartel-general em Abrantes". Felizmente que a Sta Internet nos disponibiliza estes segredos... Aqui.
Para minha memória e informação de todos, aqui ficam alguns excertos.
"A tipologia seguinte procura reflectir, em grandes grupos, a densidade de produtos tradicionais existentes na Região do Algarve e que possuem valor acrescentado local:
1. PRODUÇÕES PRIMÁRIAS
- pomar tradicional de sequeiro (amêndoa, figo, azeitona, alfarroba,...);
- culturas de regadio (laranja, tangerina, figo fresco, batata doce, uva de mesa, primores, ...);
- actividades pecuárias (cabra e cabrito algarvios, ovelha e borrego de raça churra,...);
- produção florestal (cortiça, outras espécies mediterrânicas, ...);
- ervas aromáticas (poejo, salva, orégãos,…);
- outras (frutos silvestres - medronho, amora, figo de pita, ...-; perceves de Aljezur, moluscos e bivalves; extracção de sal; ...).
2. TRANSFORMAÇÃO DE PRODUTOS AGRO-ALIMENTARES
- produtos da terra (derivados de alfarroba, doces regionais de amêndoa, azeitona britada e de sal, mel, ...);
- produtos derivados da pecuária (enchidos - chouriço, farinheira, morcela, molhe -; carne de cabrito algarvio e de borrego de raça churra, queijo de cabra fresco e curado;…);
- produtos do mar (transformação de sal marinho, flor de sal, peixes secados,...);
- licores (laranja, tangerina, figo, alfarroba, marmelo, poejo, …) e aguardente de medronho.
Estas produções têm uma história na Região e um espaço importante nas estratégias de acumulação e de rendimento dos seus produtores e das respectivas famílias. Essa importância evoluiu ao longo do tempo, com reflexos no (re)ajustamento do cálculo económico de oportunidade o qual está na origem, p.e., da transformação estrutural do pomar tradicional de sequeiro, com a substituição gradual da figueira, da amendoeira e das oliveiras, por alfarrobeiras. A quebra de preço e de qualidade dos frutos daquelas fruteiras tradicionais, aliada à pressão da concorrência externa e das estratégias de mercado dos agro-transformadores (p.e., produção em massa de miolo de amêndoa e de sal), e a ausência de melhoramento vegetal e de inovação técnica nas culturas, alteraram radicalmente as relações de valor económico em presença.
.Este tipo de análise converge para a necessidade de estabelecer prioridades produtivas fundamentalmente de dois tipos:
- produções que possam, simultaneamente, atingir massa crítica/escala de produção economicamente viável e preencher, com eficácia e eficiência, procuras típicas de nichos de mercado;
- pequenas produções que, isoladamente, não têm facilidade de escoamento e viabilidade económica mas que, inseridas em estratégias produtivas locais e de integração com outras actividades mais próximas da procura, podem atingir condições de valorização de mercado.
A proposta de produtos tradicionais prioritários contempla os seguintes produtos tradicionais de qualidade:
- derivados da alfarroba;
- flor de sal marinho;
- batata doce;
- azeitona britada;
- figo fresco;
- doçaria regional (amêndoa, figo e alfarroba);
- enchidos de Monchique;
- cabrito de raça algarvia;
- queijo de cabra algarvia.
A recolha de leite de cabra, nos concelhos interiores do Guadiana Algarvio, por industriais de lacticínios da Andaluzia, constitui um exemplo paradigmático das dificuldades em ligar a organização das produções primárias à transformação, como modo de gerar localmente maior valor para os recursos endógenos."
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